Depois de muito tempo, talvez dois anos, ouvi outra vez o disco ao vivo de Paulo Flores, músico angolano, que foi gravado a 5, 6 e 7 de maio de 2004, no Cine Teatro Karl Marx, em Luanda, Angola. Por motivos absolutamente pessoais, olhava o disco na pilha de Cd’s e sentia receio das emoções que ele poderia me causar. Hoje descobri que já posso ouvi-lo, as feridas cicatrizaram.
E o disco é bom, “é muita bom”, como se diz em Angola. Me diverti muito com o refrão de Garina: “Meu nome é Maria, como é o seu? Eu moro na Ilha, na casa do Tadeu”.
Depois, me emcionei, como sempre acontece, ao ouvir Paulo Flores interpretar Belina, de Arthur Nunes, em quimbundo, como no original: “Belina Tua Kifikideto/ Um Tuala Muené/ O Nguma ge já Kukala Kia Kumuxima”.
Arthur Nunes, um dos grandes compositores angolanos, foi morto depois de ser acusado de envolvimento na tentativa de golpe de Estado conduzida por Nito Alves, a 27 de maio de 1977. Um dos talvez 45.000 mortos que o contra-golpe fez.
E a influência brasileira, ou até latino-americana, se faz sentir em Menino Destino: “Dá-me da tua mão o meu destino, faz-me o tempo chegar correndo a passo/ traz-me no teu abraço o reconforto, bicho solto”, com um quê de Clube de Esquina... Para não falar do violoncelo de Jaques Morelenbaum, e do lindo ensaio de voz em tom gospel de Dodô Miranda.
Por último, Tito Paris em “Falso Testemunho”, com a sua voz (e o seu assovio!) inconfundível. E me fez lembrar do primeiro dia em que pisei em Luanda. A 8 de setembro de 2003, tive o privilégio de comer uma cachupa feita por Tito Paris, acompanhada de lições de criolo. Me lembro dele dizer, em tom quase maroto: “se souberes que bó é você, e nha é meu/minha, podes falar criolo”. Aí em Clarice: “Mesmo que bó tá longe, bó tá perto/ Cretcheu ó luz di nha vida”. Quanta bondade do Tito!
Nada como estar bem com o passado, e poder desfrutar dessas coisas da Angola que tanta falta me faz.
Um comentário:
Adorei o texto!
Escrito de modo simples mas, verdadeiro. Ivejo-a muito agora
que sei que conviveu com Tito.
Abraços,
Martinho Bangula
Admirador de P.Flores e T.Paris
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