11.17.2007

Angolagate: quando os bandidos usam "gravata e capital"


Já entendemos que a política implementada pelo presidente eleito em França nas últimas eleições, Nicolas Sarkozy, voltaram a privilegiar as relações com a África - claro que não falo do Mali, onde não há riquezas naturais, mas dos países onde a França tem interesses potenciais. É só relembrar que uma das primeiras viagens internacionais de Sarkozy como presidente foi a que fez para a Líbia, em visita ao presidente-ditador Kadafi...
Durante esta semana especulou-se muito na imprensa angolana sobre a visita oficial do presidente francês a Angola - não esqueçamos que há duas exploradoras de petróleo francesas atuando ali: a ELF e a Total (ainda que eu sempre me questione se esse tipo de negócio tem mesmo pátria...).
Qual não foi a minha surpresa quando lendo o Angonotícias de hoje descubro que os franceses resolveram "absolver" (entre aspas porque o julgamento não havia terminado) todos os angolanos envolvidos no caso Angolagate, e que mesmo Monsieur Falconi estava respondendo a julgamento em liberdade no âmbito dos acordos bilaterais que tocam esta questão.
O secretário francês para a cooperação e francofonia, Jean-Marie Bockel, disse mesmo que:
«foi abusivo falar-se em tráfico de armas, onde houve só comércio ilícito e tráfico de influência» de compatriotas que são processados judicialmente". SÓ COMÉRCIO ILÍCITO?!? Como assim?!? A França vai mesmo de mal a pior - se é que não esteve mesmo sempre assim -, não admira que os franceses achem normal o rapto das crianças no Tchad, deve ser SÓ o comércio ilícito de crianças...
Bom, para finalizar o assunto, o mesmo secretário francês confirmou a visita de Sarkozy a Angola para fevereiro de 2008. Até lá, não haverá mais rusgas, o caso Angolagate fará parte do passado: Falconi, mas que Falconi?!?
Neste caso, a hipocrisia, e a diplomacia hipócrita, da França caiu como uma luva para os sem-limites da nomenklatura angolana...

11.13.2007

11.12.2007

Para ti Sofia


Criei um blog só para falar de Sofia: da gestação, da espera ansiosa, das evoluções, dos hormônios. Uma tentativa de diminuir o Atlântico, e uma maneira de deixar memória para ela um dia, quem sabe...
Estamos no: http://pequenasofia.blogspot.com/

Até lá!

11.11.2007

Arco de Zoé


Desde outubro que a mídia francesa mantém o caso Arco de Zoé em sua pauta diária. No entanto, apesar de conseguirmos encontrar aqui e ali algumas críticas ao comportamento dos franceses no caso, o que impera é a defesa dos franceses em relação aos seus compatriotas.
No imbroglio que se seguiu a prisão dos sete franceses no Tchad - no momento em que estes embarcavam num avião com 103 crianças rumo a França -, não faltaram manifestações de apoio aos raptores que se encontravam aguardando o destino de sua sorte numa prosão em Abéché, no leste do Tchad.
A imprensa francesa quando se refere aos pais das crianças em causa, diz sempre "os presumíveis pais", mas jamais diz "os presumíveis raptores" em se referindo aos membros da ONG que atuava na fronteira do Tchad com o Darfur.
Sexta-feira última o presidente francês, Nicolas Sarkozy, declarou que lutava para que os franceses presos no Tchad fossem libertados para serem julgados sob júri francês, afinal, nas palavras dele, "a minha obrogação é defender os franceses, sejam eles bons ou maus".
Fica a pergunta: caso se tratasse do mesmo rapto de crianças praticado por franceses, mas na fronteira com a Alemanha o presidente teria coragem de fazer tal declaração? E os cidadãos franceses, teriam coragem de organizar mnifestações públicas de apoio aos raptores?

11.07.2007

"Hoje eu caibo nesse mesmo corpo que já coube na minha mãe"


Acabou a transumância - ao menos pelos próximos 12 meses... Quem transuma, transuma sempre, mas agora tenho um motivo para me instalar em qualquer parte: espero uma filha.
A Sofia chega a 05 de março!
O doutorado me persegue o sono, a vontade de terminar aguçadíssima, ansiedade...
Com isso, tenho menos tempo para escrever, para ler romances e dizer coisas interessantes.
Tudo o que tenho lido são discursos presidenciais, relatórios da CIA e da KGB, livros sobre grandes conspirações - matéria menos interessante para um blog...
A Sofia se mexendo é muito mais interessante! Por isso, a "foto" do post é dela!

8.31.2007

Transumância

Não escrevo sem paragem, da alma ou do corpo.
Neste momento, encontro-me em transumância do corpo, antes era da alma. E só poderei voltar a escrever quando tiver me fixado em e a qualquer parte, espero que seja em breve.
Sinto-me como Florentino Ariza e Fermina Daza em sua eterna viagem a La Dorada.
"A vida, mais do que a morte, é que não tem limites".

2.08.2007

Um pouco de todos nós em Niétotchka Niezvânova


momentos em que todas as forças da mente e da alma, numa tensão doentia, como que se inflamam com a chama brilhante da consciência, e então algo profético surge em sonho à alma abalada, que parece enlanguescida com o pressentimento do futuro, experimentando-o antecipadamente. E há uma grande vontade de viver, todo o nosso ser pede para viver, e, inflamado com a esperança mais ardente, mais cega, o nosso coração parece desafiar o futuro, com todo o seu mistério, com todo o desconhecido, ainda que em tempestades e tormentas, contanto que isso seja vida(Dostoiévski. Niétotchka Niezvânova. p. 169)

1.24.2007

Adeus a Ryszard Kapuscinsky


Levou tempo até que eu conseguisse pronunciar o seu nome, sem nunca saber ao certo se o dizia corretamente. Mais tempo ainda para conseguir escrevê-lo com as consoantes nos lugares certos.

Foi na primavera de 2002, em Lisboa, que me veio parar às mãos um seu livro: Ébano. Vinha com uma tarja vermelha envolvendo a capa, indicando um Prêmio e uma vendagem espetacular.

Ao ler as primeiras páginas, percebi que se tratava de outra coisa, diferente do que eu até então havia lido sobre o continente africano escrito por um europeu.

Lembro-me ainda da emoção que senti ao acompanhar o relato dos primeiros dias que se sucederam a independência do Ghana. Kapuscinsky deixou transbordar toda a esperança que tomava conta, não dos ganenses, mas de todos os africanos, que ainda acreditavam em seus líderes, no poder de sua gente se auto-governar, na capacidade de amor ao próximo.

Ébano é um bom livro, embora haja quem diga que tem ali umespírito de colonizador”, de quem chega para ditar verdades. Não o vejo assim. Considero-o um excelente livro para quem quer se aventurar pelos sinuosos caminhos da história do continente africano. A mim, o tom de Kapuscinsky parece algo entre o paternalismo e o aventurismo – não raras vezes, ele descreve os africanos com ar por demais infantil, e outras tantas relata acontecimentos tão fantásticos que não é difícil imaginá-lo em roupas “à la Indiana Jones”.

Mas há ainda o seu “1975. Último dia de vida em Angola”, que, até hoje, tem sido uma unanimidade entre os que estudam os dias que antecederam a independência de Angola, proclamada em Luanda. É óbvio que não tenho memória daqueles dias quentes de outubro e novembro de 1975 em Luanda, mas é como se a tivesse: penso no vento zunindo pelas ruas, arrastando caixas de papelão, casas trancadas esperando um regresso incerto, bairros-fantasma. E depois, cubanos surgindo como que encantados, falta água (começou cedo!), a rádio noticiando as boas-novas do MPLA, embora o clima geral fosse de indefinição e alerta.

Para não falar da viagem do jornalista polaco ao sul de Angola, e das páginas que deixou sobre as primeiras batalhas travadas contra o exército sul-africano naquelas paragens, e do comandante Farrusco, que servindo o exército português aliou-se ao MPLA, e orquestrou lindamente aquelas batalhas, com os poucos mais de 100 homens de que dispunha.

Claro que Kapuscinsky é muito mais do que isso. Ele é todos os percursos que trilhou, e mais todos aqueles que trilharam cada um de seus percursos.

1.16.2007

Paulo Flores e a música angolana

Depois de muito tempo, talvez dois anos, ouvi outra vez o disco ao vivo de Paulo Flores, músico angolano, que foi gravado a 5, 6 e 7 de maio de 2004, no Cine Teatro Karl Marx, em Luanda, Angola.

Por motivos absolutamente pessoais, olhava o disco na pilha de Cd’s e sentia receio das emoções que ele poderia me causar. Hoje descobri que posso ouvi-lo, as feridas cicatrizaram.

E o disco é bom, “é muita bom”, como se diz em Angola. Me diverti muito com o refrão de Garina: Meu nome é Maria, como é o seu? Eu moro na Ilha, na casa do Tadeu”.

Depois, me emcionei, como sempre acontece, ao ouvir Paulo Flores interpretar Belina, de Arthur Nunes, em quimbundo, como no original: “Belina Tua Kifikideto/ Um Tuala Muené/ O Nguma ge Kukala Kia Kumuxima”.

Arthur Nunes, um dos grandes compositores angolanos, foi morto depois de ser acusado de envolvimento na tentativa de golpe de Estado conduzida por Nito Alves, a 27 de maio de 1977. Um dos talvez 45.000 mortos que o contra-golpe fez.

E a influência brasileira, ou até latino-americana, se faz sentir em Menino Destino: “Dá-me da tua mão o meu destino, faz-me o tempo chegar correndo a passo/ traz-me no teu abraço o reconforto, bicho solto”, com um quê de Clube de Esquina... Para não falar do violoncelo de Jaques Morelenbaum, e do lindo ensaio de voz em tom gospel de Dodô Miranda.

Por último, Tito Paris em Falso Testemunho, com a sua voz (e o seu assovio!) inconfundível. E me fez lembrar do primeiro dia em que pisei em Luanda. A 8 de setembro de 2003, tive o privilégio de comer uma cachupa feita por Tito Paris, acompanhada de lições de criolo. Me lembro dele dizer, em tom quase maroto: “se souberes que bó é você, e nha é meu/minha, podes falar criolo”. em Clarice: Mesmo que bó tá longe, bó tá perto/ Cretcheu ó luz di nha vida. Quanta bondade do Tito!

Nada como estar bem com o passado, e poder desfrutar dessas coisas da Angola que tanta falta me faz.

1.05.2007

Os finais felizes nos constrangem

dez anos atrás quando ia ao cinema, saía sempre com a sensação de que tudo o que via nas telas era possível de ser vivido. Subia a Augusta, saindo do Espaço Unibanco (antigo e sempre reduto de amantes paulistanos do cinema) em direção a Paulista, esperando ser arrebatada por algum moço que se descobriu apaixonado por mim numa cruzada de olhares; ou que o orelhão tocasse, eu atendesse e toda a minha vida mudasse a partir daquela ação e suas consequências; ou ainda descobrir que tinha algum poder extrasensorial que me permitisse fazer coisas que até então não poderia.

A realidade e o tempo nos vão levando essas ilusões, mas trazem a tranquilidade da lucidez. É igualmente bom subir a Augusta com a “mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo”, sem esperar arroubos de paixão ou grandes e decisivos acontecimentos.

Hoje fomos, eu e um amigo, assitir a um filme romântico, na Avenida Paulista, numa sessão ao meio do dia, cheia de velhinhas aposentadas – como diria esse amigo, estávamos em momento de vingança do sistema capitalista: enquanto todos trabalham, nós vamos ao cinema!

O filme Um Bom Ano, com direção de Ridley Scott e atuação de Russell Crowe, tem todos os elementos de comédia romântica: mocinhos, bandidos, amores que parecem impossíveis, um velho bonachão e simpático, boa música, linda fotografia. Mas como estamos habituados a sermos surpreendidos sempreporque as coisas simples estão fora de moda -, passamos todo o filme pensando que algo terrível ia acontecer, que algum personagem mentia, dissimulava, e o fim seria trágico.

Não foi. Deu tudo certo: fomos surpeendidos por um final feliz. Ficamos quase desconcertados, sem coragem para admitir que era um bom filme e que fazia pensar, afinal finais felizes constrangem...

não é o caso de pensar em jogar tudo para cima, e sair em busca de um grande amor e uma vida pacata no campo, mas faz refletir sobre as prioridades que nos impomos, e qual o sentido que elas têm.

Me lembrei de Antonin Artaud: “O cinema é como uma dose de morfina subcutânea”. Não precisa ser endovenoso, mas podemos sonhar com finais felizes!